Reportagens

Invisíveis aos olhos apressados, casal de artistas mantém vivas representações das principais tradições de Florianópolis

Localizado no extremo Sul da ilha, ateliê e elementos artísticos conversam com a natureza que preenche o terreno

 

Reportagem e fotos por Marcos Albuquerque

Aos olhos mais apressados, passa despercebido. Aos mais atentos, coloca uma pulga atrás da orelha. O terreno fica às margens da Rodovia Baldicero Filomeno, em um ponto abaixo do nível do asfalto, entre o Ribeirão da Ilha e a Caieira da Barra do Sul. Rodeado por árvores, o ateliê e a casa de Nei e Adelaide são sombreados quase o dia todo, com o mar logo à frente, separado somente pela rua.

A vizinhança tem casinhas típicas daquela região, quase todas com apenas um pavimento, grade baixa, janelas entreabertas e jardins. Para chegar ao mundo construído pelo casal, uma placa pode auxiliar: “Bonecos de Caldas”. A pé, fica fácil ver. De carro, reduza a velocidade.

– Bom dia! Tudo bem? Eu vi esse espaço ali da rua e fiquei intrigado. É muita intromissão querer saber o que vocês fazem por aqui? O que são todos esses bonecos…

– Bom dia! Não…tranquilo, podemos conversar sim.

– Ótimo!

– Eu posso falar, mas, na verdade, só um segundo…

Ele caminha até a porta da casa e finaliza:

– Acho que para isso é melhor com Adelaide.

– Ade..

– Minha esposa. Ela está aqui dentro. 

E é por isso, porque Nei sabe quem é e quase na mesma medida conhece Adelaide, que antes de mais nada, faça-se saber: essa é uma história contada majoritariamente por Adelaide. 

Um presente compartilhado, com todas as palavras que ela fez questão de dizer, fundidas às informações breves, mas certeiras, dele.

O que inspira vocês?

“Tudo inspira, mas o mais importante é ter como foco expressar, não guardar para si, e sobreviver, claro, as duas coisas. Tem coisas que não são comerciais, que são só expressões de sentimentos. Tem coisas que achamos prontas, vêm do mar. O nosso ateliê é um pouco de nós, mas pensado também para pessoas que querem falar delas mesmas, para elas”.

Sobre os dois

Manezinho, nascido no Ribeirão da Ilha, Nei Batista, de 65 anos, é um artista. Desde pequeno, quando ainda brincava com os velhos amigos, se relacionava com o mundo de uma perspectiva só dele. “Todo mundo desenhava. A ponte Hercílio Luz e os navios. Eu me voltava para as coisas do interior, o cotidiano e o cenário mais afastado da ilha”.

Na juventude trocou o desenho pelo trabalho no ramo têxtil, ofício que aprendeu enquanto ajudava outras pessoas. Um certo dia, na década de 1970, foi até o centro da cidade acompanhar a apresentação de um grupo de Boi de Mamão, expressão cultural de origem açoriana, reconhecida como uma das marcas de Florianópolis que atravessa gerações. 

A Maricota do grupo, personagem que integra a narrativa do boi, ainda pecava na caracterização pela falta de roupas adequadas. Nei então usou suas habilidades e costurou as peças. “Eles gostaram do trabalho e depois pediram para eu fazer as camisas da cantoria e dos vaqueiros. Mais tarde eles ficaram sem um componente e eu entrei no grupo, virando também personagem daquela história”.

Depois do trabalho com as linhas, adentrou no ramo das máscaras de papel machê, muito por uma coincidência. Sua nova casa ficava no bairro Sambaqui, norte da ilha, e por lá um grupo investia em um movimento de retomada de festejos populares que vinham se perdendo. “Eu queria participar de alguma coisa e eles tinham alguém lá que sabia como fazer as peças do Boi. Essa pessoa, no meio do processo, resolveu viajar e aqueles objetos ficariam inacabados. Aí pensei: mas isso é fácil. Com um pouco de orientação, consegui. Ele me mostrou como montava o molde das máscaras e a partir do osso da cabeça de um boi. Aí disse para eu repetir o processo do outro lado. Eu peguei e fiz um cavalo. Foi a primeira vez que moldei esses itens”.

Com a técnica em mãos, Nei elaborou outros projetos nos anos seguintes. No carnaval, trabalhou como construtor de alegorias depois de descobrirem seu trabalho com as máscaras enquanto vendia produtos em uma feira local. “Fomos campeões, depois bicampeões. Era a escola do Limoeiro. Ela não existe mais hoje, se tornou outra escola, porque se fundiu com a escola de samba que tem lá no Saco dos Limões. Consulado acho, né?”. 

Nos anos 1990, o artista voltou ao Sul da ilha, onde nasceu, para fixar suas raízes no terreno onde mora atualmente.  “Vim para cá e encontrei o mar. Tava trabalhando com peças de boi de mamão, oficinas. Fui sobrevivendo. Fiquei pescando um bom tempo também. Pescando e na marisqueira. No tempo livre eu fazia peças de encomenda para grupos folclóricos, principalmente aqui de Florianópolis. Fazia boi, cabra, era uma demanda que para mim era grande. Depois deu uma esfriada, fiz um monte de outras coisas, até que eu encontrei ela e aí comecei a fazer de novo”.

Adelaide Caldas, artista de 51 anos, mudou-se de São Paulo para Florianópolis em 2016, com o intuito de recomeçar. Faz parte dela essa liberdade em transitar, entre cidades, Estados, aliada ao desejo de aprender a fazer arte sob novas formas e perspectivas. “Eu já trabalhava com artes plásticas, com arte contemporânea, fazia minhas telas, meus objetos e queria acrescentar a cerâmica”.

Foi em decorrência disso que, no ano seguinte à chegada dela na Capital, Adelaide conheceu o atual companheiro: ele trabalhava com cerâmica. “Começamos assim, com ele me dando aulas aqui nesse endereço. Ele me mostrou como fazer uma máscara. Essa primeira máscara representava a questão da infância, das nossas alegrias e dores”. 

Em 2018, quando o relacionamento deslanchou, os dois começaram a morar juntos. Além da vida compartilhada, iniciou ali a construção do ateliê onde hoje trabalham. “Levantamos juntos, com a clareza de que esse seria um ateliê aberto, em sintonia com nosso ambiente, onde as pessoas pudessem vir, ver o trabalho, trazer outras pessoas e observar”.

O quintal vivo

Muitas das características estruturais do ateliê do casal sofreram influência das experiências primárias de Adelaide. Nascida em Minas Gerais, cresceu rodeada de edificações que utilizavam como ingredientes de construção o barro, a terra, a madeira, e tinham instalados instrumentos como o fogão à lenha, colocado geralmente sob o chão batido. Hoje é em um fogão como esse que eles realizam a queima de peças de cerâmica.

Ele – Nas paredes usamos a técnica do pau a pique. Cortamos o bambu na lua correta, tudo direitinho. Ela atirava o barro de um lado e eu atirava de outro.

Ela – Foi divertido. Pisamos o barro juntos, compramos do caminhão e pisamos ele aqui fora, porque quando chegou era um barro ainda não ideal.

Ele – Ganhamos uma janela, mais essas madeiras de forro, fechamos mais uma parede. Depois ali em cima tinha que finalizar, mais uma vez usamos o pau a pique.

Ela – Eu acho que somos fragmentados e as coisas vão se encaixando, um pedaço disso e daquilo. No geral parece que uma coisa não combina com outra, mas depois vira uma bela estrutura. As diferenças caem e temos uma unidade.

Para eles, quase todos os elementos dispostos têm significado e se ainda não têm, vão ganhar. “Queremos ressignificar não só o passado, como o presente também. Mesmo que seja uma xícara, porque ela é cheia de lembranças que eu ganhei da minha avó, da minha prima, ainda que a prima não goste mais de mim. Eu posso dar um significado especial e aceitar essa prima. Tudo que temos aqui representa a capacidade de apaziguar esses sentimentos. Tirar o que está dentro e colocar para fora através da arte. É um espaço para as pessoas observarem que é possível conviver com as diferenças, porque ao mesmo tempo que não tem nada de especial aqui, tudo é especial”.  

Fora das paredes das edificações, o ateliê e os elementos artísticos conversam com a natureza que preenche uma área significativa do terreno. São árvores de pequeno, médio e grande porte. “Quase todas essas árvores aqui são de reflorestamento, que eu mesmo realizei nesse pedaço. Tem peroba, canela, cedro, jaca, gabiroba, jacarandá, embaúba. A embaúba está sempre cheia de formigas”, acrescenta Nei.

Simbiose criativa

Atualmente os dois estão trabalhando na produção de máscaras representativas dos bichos do Jogo do Bicho, de Franklin Cascaes, que elencou 25 animais em sua obra. Nei já tinha confeccionado uma coleção com essa temática na década de 1990, quando descobriu a história através dos versos de um grupo de cantoria da celebração do Terno de Reis. “Parecia que Franklin tinha tudo registrado e eu fui ver. Aí eu fui lá ver se era verdade. Aí fiz um bloco vivo dos bichos, na época do Batuqueiros do Limão”. 

Os bichos em construção vão ser utilizados em um evento cultural em Florianópolis no mês de outubro, que vai homenagear o pesquisador. “Tem coisas que eu preciso da ajuda dele. Temos o mesmo gosto por trabalhar e sempre vamos trocando opinião sobre o que estamos fazendo”, explica Adelaide.  “Vou ali, modelo, ela vem, cola, tiramos do molde, ela já vai lá para dentro, pega a tinta, pinta, entendeu? Põe os acessórios…”, comenta Nei. “Lá para dentro” é a casa do casal, nos fundos do pátio, onde parte das máscaras de animais aguarda pelos últimos ajustes.

“Nós moramos lá e aqui. Sempre transitando. A casa no fim também é ateliê”, confessa Adelaide. “Aqui não tem nenhum pronto, mas eles estão aguardando para serem finalizados. Vão ser máscaras em chapeú”. Isso quer dizer que as máscaras vão ser fixadas em pequenos chapéus – como aqueles de plástico comuns no carnaval – e depois apoiadas no topo da cabeça dos festeiros, em um encaixe planejado. De acordo com cada animal, os artesãos precisam calcular o tamanho do pescoço para fixação no chapéu e considerar a medida das cabeças de quem vai usar. “Eu sou a favor de ficarem bem certas no tamanho, para preservar os braços livres, deixar maior mobilidade de expressão, poder dançar”, Nei enfatiza.

Ele continua explicando como os itens que vêm montando se comunicam com o restante da caracterização dos festejos do Jogo do Bicho. “A máscara, o vestuário, aquela coisa toda, com o jogo do bicho, representava o sonho da riqueza, da elegância. Muitos anéis, brincos, leques, vestidos rodados, pregueados. Isso vai na cabeça para poder brincar o carnaval, cantar e beber. Nos anos 1990, exceto o formato dos bichos, que se mantém, lembro que era pouca roupa. Mas agora, para o evento, eu me inspiro na descrição detalhada através do Franklin, para que as pessoas possam se vestir como eles, os antigos, com bastante joias e outros penduricalhos”.

Tem algum animal aqui preferido, Nei?

“Eu adoro o burro, mas eu gosto mesmo da minha…”

O que o artesão diz se torna inaudível enquanto ele se afasta para outro cômodo da casa. Com assoalho mais baixo que a sala onde ficam as esculturas em finalização, uma pequena cozinha, com fogão de lenha construído em tijolos, pilares de madeiras sustentando as paredes e objetos diversos pendurados, guarda a máscara pela qual tem mais apreço.

“Aqui é um lugar escondido, uma sala secreta”, brinca Adelaide, ao descer o degrau. “O fogo estava aceso. Apagou agora”, justifica. Ela assume que costumeiramente sente frio e antes de receber um desconhecido à sua porta, era ali, ao lado daquele fogão, que se aquecia.

E por que o boi?

“Porque na infância eu tinha uma madrinha que tinha um. O “Chiquinha”. O Chiquinha tinha chifres assim, ó. “Ô Chiquinha, ô Chiquinha, ô Chiquinha”.

E você Adelaide?

“Eu gosto muito de gato. Ainda preciso finalizar os olhos, eles vão ter maquiagem”. Ela tem curso de maquiadora, então o cuidado com essa etapa, para além do zelo, conta com embasamento técnico. “Vão ter expressões mais humanas. Esse olhar é de pacificação do bicho, que muitas vezes pode ser feroz, como o leão. Ele vai ter a juba dele, pelinhos. Nós estamos fazendo uma estrutura bem legal, para durar. Cada vez que eu pinto uma peça eu imagino muita alegria e muita satisfação de quem tá usando, né? E aí eu coloco isso no olhar, né?”

Construção das peças, material de criação e inspiração

Para a construção das máscaras, são utilizados três produtos principais: argila, papel e goma. “Esse barro que tô usando veio de Canelinha e é um barro para cerâmica mesmo, barro de liga, o mesmo das panelas e jarros”, explica Nei. O município de origem do material, a cerca de 60km de Florianópolis, é conhecido como Cidade das Cerâmicas, pelo grande número de olarias que movimentam a economia local.

O papel, colocado em pequenos pedaços por cima dos moldes de cerâmica, antigamente vinha quase totalmente da reutilização de embalagens. “Vários armazéns tinham esse papel de bolsa mesmo, né? Coisas assim…Hoje não tem mais. Tem que comprar a maior parte do papel”. E o que Nei compra é o papel craft, que logo é transformado em papel machê com uso da goma, produzida artesanalmente com dois ingredientes: água e polvilho. “É a cola que era usada antigamente. Fazemos cinco ou seis camadas com o papel. Depois de seco retiramos a máscara da forma. A argila é só uma matriz, que sempre fica conosco. Às vezes usamos ossos de animais dentro da estrutura de argila para dar uma encorpada na matriz, mas geralmente é só com barro”.

Adelaide mostra ainda outro material alternativo que possuem para a confecção das peças. “Usamos papelão também, mas é mais grosso. Precisamos desfiar cada uma das camadas. Olha só, aqui. Essas caixas ganhamos e estamos desmanchando. Dificulta? Dificulta, mas temos a consciência mais limpa, tranquila. É importante também a reciclagem, o reaproveitamento das coisas. Sem contar que fica mais barato”.

A produção de cada máscara leva em média uma semana, considerando as variações climáticas que podem atrasar ou atrapalhar determinada etapa. Como o ateliê é aberto, fica suscetível às mudanças do tempo e a situação se complica quando chove ou venta muito.

Para além da demanda principal, outros produtos compõem as produções do ateliê, como as peças decorativas de cerâmica e esculturas. O processo de construção desses produtos envolve materiais diversos que vão desde objetos descartados, até penas de pássaros que visitam as árvores do pátio do casal.

“Eu recebo itens de alguns vizinhos que sabem com o que trabalhamos, embora sejam poucos. Ganho pregos, gaiolas. Você vê que eu uso elementos do aracuã, do pavão…essas penas, recolhi lá em Naufragados. Essa é de saracura, essa é de galo. Eu uso sementes, madeira, cipó. Elementos do dia a dia. Às vezes eu tiro um anel da mão e coloco numa peça. Eu quero que os trabalhos sejam falando de coisas reais. Essas penas são de um pato que eu comi. Eu e ele, nós comemos esse pato, somos selvagens também”, brinca Adelaide.

Sobre os patos

No meio do caminho da casa até o ateliê, à esquerda de um trilho batido no chão pelo deslocamento frequente entre os ambientes, um espaço retangular e cercado é a residência temporária de nove patos. Todos extrapolaram as grades e estão nadando em um pequeno riacho, que passa pelos fundos da residência e corre em direção à rua. Adelaide explica que eles, humanos, “bebem dessa água” e Nei relembra que antigamente “corria até uma cachoeira” por ali.

A estadia no cercado só não tem sido temporária, pelo menos até aqui, para uma das habitantes. “Essa é a nossa primeira pata. Ele tá querendo por ela na panela, mas eu que seria a executora, a guilhotina, então tô deixando ela viver. Ela é especial, bem boazinha. Não nada e nem suporta água”.

Indivíduo híbrido

Adelaide quer montar uma exposição só com bonecos como esse. Metade bicho, metade homem. “Comprei esse paletó para o marido e ele não quis. Aí montei essa criatura no dia do aniversário dele, e pensei: se não vier ninguém, já temos um convidado garantido. Coloquei esse lobisomem aí e falei depois para ele: Ó, já chegou o primeiro convidado! Foi ou não foi, marido?”

Nei ri.

A ideia é montar uma exposição com cinco personagens. “Queria que essa fosse para vários pontos da cidade. Um dia deixar ali na frente, noutro no restaurante que eu trabalhava”. Para complementar a renda, até recentemente Adelaide dividia o tempo no ateliê com a rotina de trabalho em um restaurante na comunidade em que mora, mas hoje os lucros das artes estão sendo suficientes.  

Desfazer os nós

Com esses cipós, que crescem enrolados em outras espécies lenhosas na mata, Adelaide espera elaborar acervo para mais uma possível exposição. “Queria construir personagens mais bruxólicos. As pessoas falam que eu tenho uma pegada do Cascaes por causa dessas temáticas, mas acho que é o acaso. Costumo dizer que eu não me inspiro em alguém que não conheci, em uma emoção que eu não senti. Eu me inspiro no que to vivendo”.

Artigo 208

“Essa tela foi uma das únicas que eu trouxe de São Paulo. É uma tela de inspiração que eu uso porque nessa época eu trabalhava e dei aula para meninas em situação de rua, meu atelier recebia meninos de rua”. Nesse período, Adelaide conta que incomodou os vizinhos e outros artistas. Ninguém conseguia engolir que ela estivesse abrindo seu espaço com o objetivo de acolher uma população tão vulnerável.

“Eu queria, nem que fosse por um dia, que aquela criança pudesse se sentir melhor ou rever as emoções dela. Transmutar também essas emoções, né?! Porque as crianças de rua de São Paulo tinham uma amargura muito grande, com a polícia, com as pessoas, com a família. Eu bancava sozinha e fui à falência nessa época. Ninguém mais queria essa aproximação com os meninos de rua e começou o boicote. Tinha um artista que possuía um ateliê logo acima e, a qualquer custo, chamava a polícia, falava que meu ateliê servia para eles cheirarem “cola”. Mas consegui ficar um ano com esse projeto e foi maravilhoso. Essa tela representa isso”.

Tudo é místico

“Nós pescamos essa sereia”.

Ah, é? E como foi essa pesca?

“Foi bem aqui na frente, bem pertinho”.

“Dissequei ela. Acho que preciso mostrar isso para o mundo. E tudo com esse tipo de material, de reaproveitamento. Pobre da sereia, mesmo dissecada, está se deteriorando e é normal. Ela é uma expressão da nossa ilusão com o mundo”.

Quatro eixos

“Esses carrinhos foram inspirados nos brinquedos que eu fazia na infância, geralmente era com latinha”, enfatiza Nei. “Muitas vezes, quando recebemos crianças no ateliê, elas acabam ganhando um exemplar. Tinha bem mais que isso, mas vez ou outra eu acabo dando um como presente”.

A casa

“Essas casinhas eu fiz também e queria que meu filho fizesse”. Adelaide se refere a Matheus, de 19 anos, que está cumprindo o serviço militar obrigatório. “To sofrendo bastante com a falta dele, principalmente porque ele é bem caseiro, embora ame esportes”.

Cárcere imaginário

“Essa é uma expressão. As pessoas acham que estão presas a uma relação. Na verdade não estão. Temos escadas para descer, janelas abertas para fugir. A gente precisa descobrir onde é que está a liberdade, afinal ela não é só uma palavra”, explica a artista.

Em algum momento vocês deixam o ateliê sozinho?

“Tem vezes que saímos um pouco, mas não nos apegamos muito. A energia que colocamos aqui é de segurança, de sentir-se em casa. E aí, se sumir alguma coisa daqui, tem que aceitar e dizer: essa pessoa só levou porque gostou muito”, reflete Adelaide.

+ Adendo

Para quem quiser, é possível acompanhar parte do processo criativo dos dois por meio do @bonecosdecaldas, no Instagram, bem como entrar em contato com os artistas por lá.

Exposição na UFSC

No início deste ano, Adelaide levou 16 de suas máscaras para uma exposição no hall de entrada do Centro de Eventos da Universidade Federal de Santa Catarina. Todas as peças, queimadas no forno instalado no quintal de casa, foram expostas em painéis na parede, com breves textos que auxiliavam a experimentação da arte pelos espectadores. 

“Eu fiz especialmente pensando nos alunos. Montei e deu certo porque os alunos assinaram o livro, se expressaram, falaram coisas. As obras tinham um pensamento de simplicidade, não eram codificadas. Todos conseguiam entender. Acho que deu certo por isso”.

Todas as máscaras tinham inspiração nos elementos locais, que Adelaide chama de “alimentos”. São com eles que ela nutre a necessidade criativa e expõe ao mundo a realidade do momento que está vivendo. “Cada prego que você vê no objeto foi recolhido por aqui. Foi um orgulho para mim quando eu fui lá expor, pude falar com as pessoas”. 

Esse orgulho passa pela defesa de Adelaide da universidade como um local que deve dar espaço para os artistas, principalmente aqueles que estão iniciando suas carreiras. “Escola tem que ser um espaço de inclusão. Ele começa a fazer a exposição lá, é o primeiro espaço expositivo. A partir dali ele vai para o MASP. Ele não começa no MASP, na A2. Mas eles conseguem começar na escola. Tem que dizer aos alunos: aqui está seu espaço. Você tá entendendo? 

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