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Sustentabilidade e ativismo na cozinha: chef abre portas de restaurante especializado em pratos vegetais

Conheça a jornada gastronômica do cozinheiro que aborda culinária vegana com um toque brasileiro

Reportagem por Ana Júlia Gonçalves

Natural do Rio de Janeiro, Ruan Felix vem de um bairro do subúrbio da capital fluminense chamado Magalhães Bastos. Começou a tomar gosto por cozinhar após se tornar vegano, já que a nova dieta exigia que colocasse um esforço na própria alimentação. A decisão de se tornar vegano foi influenciada pelo contato com as postagens nas redes sociais de uma colega de trabalho que era vegetariana. Os posts despertaram o seu interesse e o fizeram buscar mais informações. “Eu fui buscar os documentários que indicavam nas postagens e depois que eu vi aquilo pensei ‘nossa eu não quero mais fazer parte desse tipo de coisa’ ”, declara o chef. 

A partir disso, foi em busca de especialização e relata que teve uma certa dificuldade neste processo, já que a maioria dos cursos trabalha com a culinária tradicional não-vegana. No fim, o cozinheiro acabou se especializando através de um destes cursos. “Tive que me submeter a cozinhar algumas coisas que não estavam de acordo com a minha filosofia, mas sempre tendo em mente que era um processo para algo que estava por vir, né?”, relata Ruan. 

Durante toda a sua formação, ele trabalhava vendendo e entregando marmitas congeladas. A rotina era puxada, já que durante o dia ele realizava as entregas e frequentava o curso, e de noite ao chegar em casa precisava cozinhar as marmitas para o dia seguinte. Depois de formado, o estágio em um restaurante de São Paulo permitiu que expandisse os seus horizontes, que até então haviam sido limitados pela vivência no subúrbio. O seu retorno ao Rio foi acompanhado de novas vontades: “Eu encerrei o meu projeto de delivery de marmitas e comecei a fazer eventos em casas colaborativas, que recebem um chefe”. Segundo ele, foi a partir daí que começou a ser mais reconhecido pelo seu nome, juntamente com os textos que publicava em suas redes sociais sobre como uma cozinha vegana pode ser mais profissional.

Um dos problemas que o chef encontra hoje é que a gastronomia tradicional não enxerga muito valor na cozinha vegetal, e a ausência de elementos como derivados de leite nas receitas leva muitos cozinheiros tradicionais a considerá-la algo menor. “Parece que a cozinha vegetal é menos, por conta disso, quando na verdade a gente tem muito mais opções e muito mais processos para conhecer”. Félix acredita que é preciso explorar mais a culinária baseada em ingredientes vegetais de forma que se possibilite que a cozinha vegetal seja levada mais a sério. 

Aberto no fim de setembro de 2023, o restaurante na capital de Santa Catarina veio de uma vontade que Félix já possuía há algum tempo. O cozinheiro conta que a falta de restaurantes veganos que trabalhem com a culinária brasileira, utilizando ingredientes brasileiros, foi uma das questões que motivou o seu desejo de abrir um estabelecimento que fosse referência na cozinha vegetal nacional. O nome Magá é uma homenagem ao seu bairro de origem, Magalhães de Bastos. 

“Eu costumo dizer que se você for no restaurante vegano em Recife e no restaurante vegano em Porto Alegre, você provavelmente vai comer as mesmas coisas”, afirma. De acordo com Ruan, a maioria dos restaurantes veganos apenas replica receitas como húmus ou lasanha de berinjela, e os lugares em que se trabalha com ingredientes brasileiros em seus pratos até existem, mas estes não são veganos. Sua proposta era trazer estes elementos para dentro da cozinha. “A gente é tão rico em ingredientes, mas trabalha tão pouco com eles”.

A possibilidade de abrir o seu próprio restaurante surgiu por acaso, através de um aluno de um de seus cursos de gastronomia, que o apresentou à ideia em sua primeira vinda à Florianópolis, em abril de 2022. De início, Ruan não deu muita atenção, mas conforme o tempo foi passando, o interesse pela cidade foi surgindo, junto da vontade de se mudar para cá.  Na primeira aula que ministrou já morando aqui, o aluno estava presente e reforçou a ideia de abrir um restaurante. “E aí eu vi que ele tava falando sério e disse ‘Então já que você quer mesmo abrir, vamos ver no que vai dar isso’, e aí hoje temos o Magá ”, relata Félix.

Há um ano em Florianópolis, o chef enxerga um cenário gastronômico muito rico na cidade, mas sentia uma ausência de um local onde realmente se pudesse sair para jantar: “Se você quiser comemorar o seu aniversário de casamento ou qualquer coisa do tipo onde você vai levar a sua família, seu companheiro,não tem lugar para jantar”. Para ele, o seu restaurante veio para suprir essa necessidade, de uma cozinha vegetal brasileira e também de uma proposta mais intimista para jantares.

Atualmente, Ruan não considera que participa tanto do ativismo vegano como há alguns anos, mas coloca uma ênfase maior nas suas ações como forma de promover o movimento. “Eu faço as minhas escolhas e as pessoas talvez se vejam refletidas nisso ou se vejam representadas por isso”. No início da sua jornada como vegano, a sua atuação era mais intensa: “Eu acho que como toda mudança, a gente quer espalhar isso para todo mundo, quer convencer todo mundo a fazer aquilo que você tá fazendo e eu não fui muito diferente”.

Apesar de não ser mais tão ativo na militância, para ele, o Casa Magá traz muitas de suas crenças como ativista em geral. A ausência de animais nos pratos é um desses aspectos, mas entre eles também estão o tratamento e remuneração da equipe do restaurante ou a garantia de que os ingredientes tenham origens orgânicas. A cozinha do local utiliza pequenos produtores orgânicos para elaborar os pratos, e a horta do restaurante também fornece ingredientes para os pratos.  

Ele conta que “é desafiador abrir um restaurante, principalmente com tudo que a gente acredita, mas tem sido muito interessante ver o progresso do [Casa] Magá”. Até então, as atividades no restaurante têm ocorrido de acordo com os planos, mas a alta procura vem surpreendendo. “Um restaurante que inaugura ele nem sempre enche logo de cara, né? Ele demora um pouco para ser conhecido, né?”, conta Ruan.  

Com relação às expectativas para o futuro da Casa Magá, o chef espera que ele possa ser um pontapé para restaurantes vegetais no Brasil, sendo uma referência na cozinha nacional e vegetal. 

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