RAP no Desterro: gênero musical conquista Florianópolis
Reportagem: Larissa Gaspar (larissa.gasparcp@gmail.com) e Luiza Kons (lupkons@gmail.com)
“De volta a vida de Solteiro depois de um tempo casado. Alguns dias sem pegar ninguém, já to ficando preocupado”. Com a melodia típica do RAP, é assim que começa “Fazida”, a nova música do Mc Eltin de Floripa, lançada nesta quinta-feira (29).
Na produção do vídeo musical, Eltin fez questão de participar até da escrita do roteiro.“Coloco a mão na massa sim, porque ninguém vai fazer um trabalho tão bem quanto tu”. Foi com essa filosofia que Elton Gobbi, mais conhecido como Mc Eltin, teve o primeiro contato com letras de música ainda pequeno, quando fazia sátiras de músicas conhecidas. A primeira foi Garota de Ipanema. “Meus cadernos ficavam mais com versos do que com as matérias passadas’’. Hoje, Eltin é um dos nomes mais expressivos do gênero musical em Florianópolis, e revela que ao conhecer o RAP se identificou com a expressividade que se adquire interpretando a letra. A princípio ele ainda não tinha nenhuma base musical.“Comecei a ter contato com os instrumentos depois de aprender a cantar”.
Com o sotaque manezinho e o jeito solto de quem fala o que está pensando mesmo, Eltin comenta que seu principal espelho musical foi Os Racionais. Mas que foi a nova escola do RAP, principalmente o coletivo Quinto Andar, que o fez repensar a música. “Conheci esse novo lado de escrever e quis fazer parte desse coletivo”.
O início da carreira se deu com as batalhas que ocorriam no Rio de Janeiro. Ele decidiu se mudar para a cidade pouco tempo depois. “Muitas das batalhas eram seletivas para a liga dos Mc’s então se você quisesse participar do torneio principal precisava ganhar uma das batalhas semanais’’.
Esse período foi importante para que Eltin pudesse conhecer pessoas do ramo, pensar seriamente na carreira e ganhar experiência. Morou com vários artistas do RAP que estavam iniciando a carreira, em um período que era cercado de movimentos culturais espontâneos pela cidade. De acordo, com Eltin as pessoas se encontravam embaixo da escadaria da Lapa para fazer batalhas.
Quando retornou a Florianópolis, em 2004, possuía uma música no repertório: Mercenária Juvenil. A composição conseguiu agradar o público da cidade que ouvia. Eltin conta que testou a música no palco para ver se o público aprovaria, e que continua aplicando essa técnica para saber quais projetos musicais deve manter.
Já faz seis anos que o Mc consegue se sustentar apenas com a música. Ele atribui grande parte do retorno financeiro à evolução da internet e dos “home studios” que dão liberdade para o artista desenvolver o próprio trabalho, sem depender exclusivamente de uma gravadora. Mas, não se esquece de que no começo as coisas foram bastante conturbadas. “Minha família sempre foi contra. Não aceitavam, porque a dificuldade de ser músico no Brasil é imensa. Hoje, eu me considero um cara de sorte.”
Eltin avalia que sua carreira poderia ter se desenvolvido melhor se estivesse em São Paulo ou no Rio de Janeiro, mas não trocaria a vida simples que leva em Florianópolis por nada. “Prefiro comer uma tainha assada que um prato muito chique, prefiro estar na praia com meus amigos do que na balada.”
O cenário musical do RAP, no entanto, não é apenas composto por homens como Eltin. Anna Puga, de 27 anos, vem mostrando com dedicação e talento que o RAP também é um espaço das mulheres. Puga é designer, trabalha com publicidade de eventos e concilia a carreira musical.
O gosto pelo RAP, a escrita, e a percursão esteve presente desde a infância: “quando eu tinha sete anos e me mudei de Santos para cá já escrevia, e minha mãe guardava as anotações”. Na família, que tem músicos, Puga sempre foi elogiada pelas palavras compostas. Já o primeiro RAP foi composto em 2002, quando escreveu uma canção sobre o fim do mundo previsto pelos astecas em 2012.
Ela explica que evita palavras de baixo calão nas composições e procura usar frases inteligentes para que as pessoas procurem o significado “para passar uma mensagem que a pessoa leve para si”. Costuma compor em seu quarto a noite quando tudo está em silêncio, porque durante o dia tem que trabalhar nas artes de divulgação de eventos e festas.
Apesar das dificuldades em conciliar as duas carreeiras, a rapper considera vantajoso ser designer de eventos por involuntariamente estar envolvida com esse meio. “Como tem que fazer a imagem de outras pessoas vai aprendendo a fazer a própria bombar”. Puga acredita que ao estar madura o suficiente para fazer o próprio marketing da carreira, de forma correta, as coisas vão deslanchar .”Só de música ainda não dá para viver, mas minha mãe sempre falou foca em uma profissão para poder investir naquilo que tu ama”.
Assim como Eltin, Puga enxerga o investimento na internet como essencial. Ela ainda não possui a ajuda de ninguém para desenvolver a própria carreira, então procura economizar para investir em suas músicas. Sempre que pode investe em posts patrocinados do Facebook e faz todos os amigos assistirem seus vídeos no Youtube .
Mas, foi com uma aparição no programa Encontro com Fátima Bernardes, em 2014, que o nome Anna Puga conquistou mais destaque. Depois da participação com outras mulheres que estão se destacando no RAP, recebeu no mesmo dia mais de 1200 solicitações de amizade no Facebook e muitos elogios. “Abriu minha mente e me deixou mais segura, muita gente não botou fé, que tinham minas daqui que mereciam mais”.
A aparição na TV Globo, que ajudou na visibilidade, foi um empurrão na vida da free-style que passou a ter foco e estudar mais. De acordo com Puga, até então estava andando com pessoas erradas e a mudança fez com que os pais tivessem confiança e a apoiassem na carreira.
Porém, ainda existe um longo caminho para a jovem conseguir ser “uma das grandes”, ao lado de seus ídolos, como Arlindo Cruz. Para Anna, falta oportunidade em Florianópolis: o cenário musical ainda é fechado, rodeado de panelas, há uma carência de espaços culturais, e valorizam muito mais artistas que são de fora. “Tem o Mc Eltin que leva o nome de Floripa, mas existem muitos outros homens e mulheres, também de outros segmentos musicais, que merecem reconhecimento”.
Assista o vídeo: