Mãos de Barro: Única escola de oleiros da América Latina mantém tradição viva em São José
Por Maria Clara de Farias
A colonização de São José, na Grande Florianópolis, teve início em 1750, com a chegada dos açorianos. A bagagem vinda do arquipélago português trouxe tradições que pelas mãos dos de hoje seguem vivas na cultura da cidade. Da confecção de redes de pesca, às mãos que tecem a renda de bilro, até as de barro que moldam a cerâmica, a arte manual segue viva e honrando os seus ancestrais açorianos. Única da América-Latina, a Escola de Oleiros Joaquim Antônio Medeiros tem esse compromisso, de manter viva uma tradição que aos poucos vem sendo esquecida.

Escola de Oleiros Joaquim Antônio Medeiros, localizada no bairro Ponta de Baixo em São José. Seu Joaquim dedicou toda a sua vida a cerâmica e fundou sua olaria em 1918, onde forneceu peças utilitárias em cerâmica para toda São José e cidades vizinhas. 74 anos depois, em 1992, ela se tornaria a única escola de oleiros da América Latina, e seria nomeada em sua homenagem.

Aluno inicia o processo de produção de uma moringa, utensílio tradicional utilizado para armazenar e servir água, em um dos seis torno da escola. O que torna a Escola de Oleiros Joaquim Antônio Medeiros a única escola de oleiros da América-Latina é a sua metodologia. Tereza Bez, coordenadora da escola, diz que a instituição é a única que utiliza do método de ensino tradicional roda de oleiro, também conhecida como torno.

Mestre Ivo auxilia aluno na roda de oleiro. Quatro mestres, oito mãos que mantêm viva uma tradição. A Escola de Oleiros Joaquim Antônio Medeiros oferece 3 modalidades de curso: Modelagem Figurativa, Modelagem Acordelada e Tradicional Roda de oleiro.

Mestre Ilson dos Santos, um dos quatro mestres da escola, produz um pires. Da terceira geração de oleiros de sua família, ele é o responsável pelo curso Roda Tradicional de Oleiro e começou a produzir peças de cerâmica aos 12 anos, e há 23 é professor da Escola de Oleiros. Um dos responsáveis pela criação da escola foi seu pai, Duca

Aluno produz peça utilitária de cerâmica. A cerâmica utilitária é criada para atividades cotidianas, como cozinhar, armazenar alimentos ou bebidas, servir e comer. algumas propriedades específicas, como matérias-primas usadas, temperatura de queima e esmaltação adequada, são importantes para garantir a funcionalidade da peça.

Mãos de aluno e mestre Ivo se misturam na criação de uma moringa. A escola recebe quase 200 alunos por ano. As aulas acontecem nos três períodos do dia: manhã, tarde e noite, e têm duração de duas horas. A formação dura dois anos e após a finalização do curso os alunos, agora oleiros, podem abrir seus próprios ateliês e tornar a cerâmica seu ofício ou ensinar a arte a outras pessoas.

Cabeças feitas pelos alunos. Durante o período natalino as artes produzidas na escola se transforma em um grande presépio na praça do Centro Histórico de São José. As estruturas das cabeças de Maria, José e os três reis magos, são ocas e colocadas em estacas de ferro “vestidas”.

Wilmarli é aluna de Modelagem Figurativa e tem a olaria como uma lembrança da infância. “Quando era pequena sempre tive loucinhas de barro, adorava, sempre gostei muito”, diz. Mesmo com pouco tempo na olaria, ela admite que já sente paz ao criar uma peça e o contato com a natureza ao encostar no barro.

Aos sábados a escola fica aberta para visitação, através do projeto da Prefeitura de São José, Roteiro da Memória. A cidade foi símbolo da cerâmica em Santa Catarina, sendo nomeada a “Capital da Louça de Barro” e até hoje é a cidade com maior concentração de olarias no estado. Em seu auge, nos anos 50, São josé já abrigou 29 olarias, hoje, só restam quatro.

Mestre Ilson auxilia a aluna Ana Laura, que vê a olaria como um refúgio e aliada para lidar com a ansiedade e o estresse, um lugar para desacelerar e perder a noção do tempo. Além disso é na escola de oleiros que ela estimula sua criatividade e pode expressar suas emoções no barro.