A crise revoluciona

Reportagem Gabriel Iwood

Do outro lado do Diagrama de Nolan, Matheus Rosa, 22, se considera um revolucionário. Natural de Imbituba, litoral sul de Santa Catarina, cursa a sexta fase de Economia na UFSC. O estudante narra sua entrada na política como algo natural e inevitável frente à crise do país. “A gente tem uma juventude imersa no desemprego”, explica. “É a primeira geração na história do Brasil que não consegue ter o mesmo padrão de vida dos pais”. Matheus conversou comigo no Instituto de Estudos Latino Americanos (IELA), no Centro Socioeconômico da UFSC, onde estagia.

A militância do imbitubense começou no Centro Acadêmico de Economia. Lá ele percebeu a necessidade de se organizar melhor politicamente. Foi quando conheceu a então recém criada Revolução Brasileira, uma corrente do Partido Socialismo e Liberdade. O PSOL se organiza através dessas “correntes”, das quais cada qual tem a sua forma particular de pensar a política. Assim, argumentam seus militantes, é possível somar uma maior pluralidade dentro do partido. 

“[A RB] surge a partir de uma leitura que a gente faz da sociedade brasileira e da postura da esquerda, de que um novo radicalismo político deveria ser fundado”, conta Matheus. Essa corrente nasce, de certa forma, como resposta à descrença da população no sistema político. Para eles, os governos petistas não avançaram em questões realmente populares, se limitando à branda conciliação de classes. Isso teria desacreditado a esquerda junto às bases, resultando na crise ideológica que o país vive hoje. Seria necessário, portanto, um modelo de esquerda comprometido integralmente com as classes trabalhadoras. “A crise do capital que se aprofundou fez com que não fosse mais possível que classes antagônicas se conciliassem”, comenta. Na Revolução Brasileira, “revolução” não fica só no nome.

Na opinião do estudante, sua organização é diferente de qualquer outra, e isso o inspira a lutar. Ao contrário do que é regra no modelo tradicional partidário, inclusive dentro do próprio PSOL, Matheus nega que sua corrente tenha um fim eleitoreiro. “Faço política hoje porque estou numa organização que consegue ver um horizonte mais amplo, consegue compreender a política como ela é de fato: um jogo de poder entre distintas classes sociais”. 

Sério e, às vezes, prolixo, Matheus se torna mais enérgico quando pergunto o que o ganhou em mais de 2 anos na RB. A possibilidade de aplicar aquilo que se estuda sobre os teóricos na vida real é o combustível para o militante.  “Quando você vai para prática e vê real como as coisas são, você tem que reinterpretar. Esse contato entre teoria e prática é a melhor coisa possível de se estar em uma organização”.

Já no que diz respeito a sua maior decepção, Matheus mostra, mais uma vez, que apesar de estar dentro de um dos partidos políticos mais tradicionais do Brasil, a Revolução Brasileira não compactua com a clássica burocracia que a cerca. Antes que o PSOL tivesse um candidato à presidência, a RB propôs o seu nome para as eleições prévias internas: o conhecido professor dos departamentos de Economia e Relações Internacionais da UFSC, Nildo Ouriques. Matheus conta que foram sete meses de intenso trabalho de construção e articulação junto a outras correntes pessolistas para, no final, ver todo esse esforço ir por água abaixo. “Vem uma candidatura de uma pessoa que nem era do partido, o Guilherme Boulos. Ele entra por um acordo por cima, com a cúpula da direção, sem conversar com ninguém da base, ignora todo um passado de construção e sai como candidato a presidente da República, tomando o partido de arrasto”, narra decepcionado.  

Essa situação desagradável, que poderia fazê-lo desanimar ou até desistir, não afetou Matheus. Pelo contrário: deu mais esperança ainda de que esse modelo tende a mudar em breve, uma vez que, das eleições para cá, as coisas ficaram ainda mais difíceis. Para ele, a crise na forma de governar iniciada com o Plano Real, se agrava a cada dia e isso pode ser um indicativo de que o modelo proposto pela RB pode ter mais adesão. “Pode parecer estranho, mas esse cenário que é grave, também coloca um horizonte no futuro. Não há a mínima possibilidade de que o povo aguente essa crise por muito tempo”. Dessa forma, necessariamente, a postura dos partidos devem mudar para que o sistema mude e volte a ter a confiança das pessoas, o que levaria à revolução tão aspirada pela organização. Mas isso só será possível se a população estiver articulada e se houver uma vanguarda política preparada para fazer esse processo acontecer. Essa é a função da RB, segundo Matheus. 

Quando perguntou se ele se interessaria por concorrer a eleições para cargos na política institucional, o estudante é categórico: “Eu sou um militante revolucionário. Não tenho aspirações desse tipo”. Insisto na pergunta e provoco sobre qual alternativa ele vê além dessa forma atuação, ele responde que a RB propõe outras maneiras. Por enquanto, afirma que se manterá firme no movimento estudantil. Quando terminar o curso, procurará outros movimentos em que atuar. “Pode ser num sindicato, organizando trabalhadores, dando consciência política; pode ser dentro do próprio partido político, fazendo política ali, levando a linha da RB, fazendo esse embate interno”. 

Matheus leva sua fala a sério quando diz que não acredita na política eleitoreira como única forma de causar mudanças, e essa filosofia é coerente com o nome de “Revolução” Brasileira. Ele completa dizendo que não tem aspirações individuais dentro da política, que mais importante que isso é ajudar o povo a se organizar. “Se a gente não fizer isso, a direita vai fazer. Porque a direita consegue fazer isso muito fácil. Na direita, o simples fato de não organizar, já organiza”, estabelece o estudante em um tom de voz tão horizontal quanto seu ideal de organização social.