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Patrícia Aguillera é a primeira aluna a garantir o uso de seu nome social na UFSC

texto: Ediane Mattos ( edimattos@gmail.com )

Manezinha da Ilha, filha única de pais separados, ela cresceu em uma família rodeada de primos e primas. Desde criança brincava de bonecas, de casinha e já se sentia como menina. O tratamento dispensado pela família não era diferente. “Eles me tinham como uma criança delicada. Se alguém tinha que ir ao mercado comprar qualquer coisa eu era a última da lista, por proteção”. Aos 16 anos entrou com um pedido na justiça e ganhou o direito de ficar sob a tutela da sua diretora do grupo de teatro Saúde em cena. Queria se manter afastada da convivência com o pai. “Eu preferi me afastar dele porque ele não me aceitava. Minha preocupação era não decepcioná-lo”. Eles mantêm contato, porém “ele só me chama pelo meu nome de registro”.

Patrícia passou no vestibular para o curso de Arquivologia e ingressou no segundo semestre de 2011. Com informações de que algumas universidades já tinham aprovado a utilização do nome social, na matrícula já solicitou que a UFSC fizesse o mesmo. Acabou sendo uma pioneira,  a responsável por trazer o assunto de volta aos debates na Universidade. Teve a possibilidade de entrar no primeiro semestre, mas preferiu esperar até que conseguisse a inclusão do seu nome social nos registros. “Eu fiz o pedido no dia da matrícula e pensei que não seria tão difícil”. Da abertura do processo, em fevereiro, até a inclusão do nome social se passaram quase seis meses. Neste período, a estudante enfrentou a falta de conhecimento dentro da Universidade e uma greve dos servidores que também contribuiu para a lentidão do processo. Seu nome foi incluído antes do início do semestre letivo. “Se não fosse decidido até o começo das aulas eu não iria entrar. Iria trancar minha matrícula para evitar o constrangimento que a exposição traria”.

Ao solicitar o pedido de inclusão ao servidor, Patrícia conta que teve que explicar o que queria. “Falei, ‘moço eu quero trocar o meu nome’ ele me perguntou qual era o meu nome. Quando respondi Patrícia ele argumentou ‘mas Patrícia é um nome tão bonito’. Ele só entendeu o que eu queria quando eu lhe entreguei a identidade”.

“Quando eu consegui a inclusão do nome social eu preferi não divulgar, não aparecer. Por mais que fosse uma vitória eu não queria ser apontada. Não era esse o intuito”. Ela explica que queria ter uma vivência normal dentro da instituição acadêmica sem tratamento diferenciado por qualquer motivo que fosse. Desde que ingressou no curso, sua permanência tem sido muito tranquila. Patrícia deixa claro que “ainda” não sofreu preconceito por parte de alunos, professores ou técnicos. “Eu digo ainda, porque sei que essa probabilidade existe”. Ela atribui a sua postura discreta.

Até a decisão final, Patrícia participou de algumas entrevistas para a avaliação do seu processo e defende que esse procedimento deve ser mantido para que não vire bagunça e pessoas que realmente precisam não sejam prejudicadas.

Em seu primeiro semestre de faculdade, Patrícia passou alguns momentos de constrangimentos. Como alguns professores se utilizam do Moodle como material de apoio para as aulas,  ela se sentiu prejudicada por não ter incluído o sistema nos documentos relacionados para a utilização do nome social. “Eu não tinha conhecimento dos sistemas de uso interno da instituição e como no Moodle ( sistema de educação online) os dados que aparecem são os do CAGR, acabava não participando para não me expor.” Em pelo menos outros dois momentos Patrícia teve que contornar a situação. Ela participou de duas eleições, para reitor e para Diretório Central dos Estudantes, e na lista de assinar presença na votação constava seu nome de registro. “Eu ignorei, coloquei meu nome social e meu número de matrícula no final da folha, assinei e votei normalmente”.

Patrícia está recebendo apoio psicológico que precede a cirurgia de mudança de sexo, prevista para daqui um ano e meio. E que permitirá receber seu diploma de formatura com o nome social.

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